Hoje
queria ser capaz de escrever uma coisa que tocasse num sítio tão escondido
dentro de ti que fosse mais ou menos obrigatório chorares. De emoção. Lágrimas
boas que te lembrassem, quem sabe, ao que vieste. E porque vim contigo. Era o
que gostava de conseguir hoje, tocar-te. Ir onde só uma Parte está autorizada a
ir quando a Outra pára na Ilusão de que chegou. Quando confunde o Fim, que nem
sequer é feliz, com um intervalo. Só um pequeno intervalo. Mais um. De tantos
que se fazem porque a certa altura, depois de certos erros, dói mais falhar do
que fazer de conta que acertámos. E então faz-se de conta. É aí que estou. No
limiar da tua desistência a pedir-te que venhas. Que voes para aqui, para casa.
Que, por favor, não te esqueças de mim. Do acordado. Tenho saudades tuas e ao
ninho que fui ajeitando no meio do meu peito, falta a tua metade.
Vem…
Espero
por ti no lugar do costume. Acendi a fogueira para estar quentinho quando
chegares. Espero por ti numa destas manhãs a acordar-me com um beijo e um
pedido de desculpas pela demora. Espero por ti para te dizer com alívio que não
faz mal e que ainda bem que chegaste. Vou abraçar-te até te sentir real e soltar-te só
quanto te ouvir a rir enquanto me prometes que no dia seguinte e no outro e no
outro ainda vais estar ali, comigo, debaixo da nossa árvore à beira do rio.
Descansaremos
finalmente. Arrumados um no outro perceberemos que seria impossível cabermos
noutro lado. Noutro alguém. Foi por isso que apesar de todo o esforço, da
vontade sincera de fazer com que resultasse e de alguma dose de preces quase
mordidas, nunca na verdade coubemos. Nem ninguém teve a medida exacta do nosso
espaço por ocupar. É que os nossos recortes são gémeos. Ímpares. Filhos das
mesmas despedidas que nos separam à nascença para que nos procurássemos. Nos
reconhecêssemos e fosse cumprida em nós a palavra do profeta que anuncia que o
que Deus juntou nada pode separar. Nada. Nem o tempo. Os outros. A vida que se
complica. Que ajudamos a complicar. Tudo servirá esse momento celeste da fusão
destes dois nossos corpos em nome da unidade do espírito. Teremos o céu inteiro
a celebrar connosco porque conseguimos. E as estrelas irão descer sobre nós
para nos dizer obrigado por as termos seguido.
Não
te vou mentir. Tenho receio que não estejas desenvencilhado do mundo quando nos
avistarmos. Que andes distraído a ser marido. Pai, sei lá. Responsável
Respeitável. Homem sério a acreditar que o que existe é o que se vê. Que isso
dos sonhos é para as mulheres e os tolos. E se não te apetecer abandonar o que
conheces para te entregares a uma desconhecida, com o mesmo tipo de fé guardada
para os amores incondicionais, intemporais. Podes ignorar-me. Permanecer igual
e seguro longe das nuvens para onde aponto. Podes recusar o meu convite…
Também
receio por mim. Daquilo que te digo debaixo da coberta e que não entendo nem me
lembro. Depois disso não te vejo mais. Temo partir. De novo. Ir embora sem me
importar com o vazio impreenchível que sei que vai ficar. Eu já não sei ser
feliz e posso não querer o presente que tens para mim. Se estás a ler isto,
guarda. Pode chegar a altura de seres tu a pedir-me para não me esquecer de ti.
Do acordado. Não me deixes ir assim. Segura-me contra ti. Cola-me ao teu
coração e diz-me para não ir. Com os teus braços fundidos à minha volta,
relembra-me onde pertenço. Diz-me baixinho que estás cansado de sentir a minha
falta e de me procurar por aí. De sonhares comigo à tua espera algures… do
toque, do cheiro, de todos os meus centímetros que já conheces e que darias
tudo para contar mais uma vez.
Se
estás a ler isto, e se és tu, talvez tenha conseguido tocar-te.
Espera
por mim…Numa destas voltas havemos de nos encontrar porque a força que nos
empurra é a mesma que nos junta.
Guarda
isto para lermos os dois, enrolados um no outro, no sítio do costume iluminado
pela fogueira que não vou deixar que se apague.
IdoMind
about happy endings and happy lives