abril 30, 2009

A confusão

Apetece-me chorar várias lágrimas. Daquelas grossas que quase fazem barulho quando caem. Dar um berro a alguém. Dizer finalmente ao mundo que estou aqui e sem medo do que possam pensar de mim.
É claro que não vou fazer nada disto. É feio mostrar que sou humana e que também me canso.

Talvez me sente sossegada à procura das razões que me levaram a julgar as emoções uma coisa má. Em que momento e face a que evento conclui que viveria melhor sem manifestar aquilo que me torna única – os sentimentos.

Sim. Tenho de mergulhar fundo nesta missão de resgate do sentir. Vou começar por ir lá atrás, quando tudo começou, no seio da minha família, quando era ainda um pequeno ser curioso a tactear a realidade.
Lembro-me de olhar para os meus pais com o respeito e a confiança com que se olha para quem assume a responsabilidade de nos tornar pessoas. Deles nada esperava, porque não sabia o que esperar da vida, nem o que esta tinha para me dar. Na altura apenas existia. Tudo era novo, tudo era simples. E ali estava eu pronta desvendar todas as possibilidades de cada dia. Era inocente e era feliz. Ria até rebolar no chão se tinha vontade e chorava em igual proporção se estava triste.


Tudo mudou quando fui apresentada ao Bem e ao Mal. Afinal havia fronteiras para a minha liberdade de me descobrir através do mundo lá fora. Eu não podia tudo. Aceitei. Afinal se os meus pais diziam que eu não podia tudo, era porque não podia…
A minha alma de aventureira começou a encolher a cada instrução do que era aceitável e daquilo que era totalmente proibido. Comecei a preocupar-me em memorizar os comportamentos mais adequados conforme as situações e as pessoas. Já não era tão feliz. Permanecia, no entanto, inocente. Achava que tudo deveria ter um sentido que eu ainda não tinha entendido. Os adultos, e não apenas os meus pais, agiam assim, de acordo com aquelas arrumações mentais. Alguém tão pequeno como eu não podia estar certo. Porque isto significava que os grandes estavam errados. Pois, porque também me ensinaram que havia o Certo e o Errado. Comecei a encontrar um padrão: para alguma coisa, havia sempre a coisa contrária e apenas uma era boa e certa. Continuei a aceitar. E a encolher.

Foi em casa que aprendi a controlar as emoções. As meninas bonitas não choram, não se zangam, não têm medo de nada, não pedem ajuda… As meninas bonitas não reclamam atenção com gestos carinhosos excessivos ou actos de rebeldia despropositados. As meninas bonitas aguentam o peso daquilo que não compreendem.
Eu fui uma menina bonita.

Veio a escola. A ansiedade do primeiro dia do meu maior sonho era demasiada para que eu aguardasse pelas 13 horas. Pelas 12h estava à porta da escola, à espera, escondida pela mochila duas vezes maior que eu.
Na escola também pensavam como os meus pais. Tudo bem arrumado e catalogado em certos e errados, em bons e maus, em correcto e incorrecto, podes e não pode, deves e não deves. Rendi-me às evidências e fiz minhas, as lições dos adultos.
Os finais de tarde com os primos a assaltar as hortas dos vizinhos conheceram um fim. Não tivemos mais o prazer de partilhar o saque composto de cenouras, tomates e maçarocas de milho, tão corajosamente conseguidos. A Rosa Ú não era para brincadeiras, arriscámos a vida cada vez que colhemos uma flor do seu quintal…

Já treinada a comportar-me, fui refinando o modo de agir. Chegou o primeiro emprego e os “deves isto e não deves aquilo” “se fizeres isso vão pensar isto.”,”se fosse a ti não arriscava”, “hoje não que o chefe está mal disposto”.

Toma um comprimido se tens dores, vai tomar um café se estás mal e só te apetece gritar, fuma um cigarro para aliviar a raiva de não poderes dar um murro na mesa. Finge que estás morta para disfarçar a vontade de morrer…
Faz o que for preciso, mas sê uma menina bonita e não incomodes os outros com aquilo que sentes. Por favor.

O primeiro namorado… O auge da manipulação e do domínio dos sentimentos. Eu sei, devia ser ao contrário, mas vi-me confrontada com a necessidade de esconder o amor, de o dar em pequenas medidas, de o reservar para certos momentos. Não é assim com toda a gente? Fui percebendo que este campo é o mais perigoso para mostrar verdadeiramente o que nos vai no coração. Disseram-me que não se pode mostrar o quanto se ama porque isso vai assustar. Dizer que se está magoada, nem pensar!! Meio caminho andado para perdermos todo e qualquer valor. Além de que o parceiro vai perceber que temos fraquezas e esse é o princípio do fim. O conveniente é ir mostrando, com recato e algum controlo, que até gostamos da pessoa. Conter a maior parte dos abraços que temos vontade de dar, pois, de contrário, vai achar que somos tontinhas ou, pior, carentes. Impõe-se alguma contenção de emoções para que funcione. Não queremos que pensem que somos instáveis.

Cheguei aqui. Não fosse a minha busca de sentido para tudo isto, certamente já tinha esquecido que tenho coração. Que este bate e que também, uma vez por outra, sente.
Como estavam longe, os adultos, da essência da vida… Nada há de errado em mostrar dor ou tristeza. Também não há nada de errado em mostrar amor. Não faz de nós menos. Pelo contrário, é partilhando um choro ou estendendo uma mão que revelamos a grandeza dentro de nós. É preciso ser grande para dizer que nem sempre fazemos tudo do melhor modo e que doi colher os frutos da sementeira.
Com esta honestidade damos espaço a quem nos ama de também ser grande e de juntos gerarmos amor e mais amor uns pelos outros. De nos conhecermos na verdade e consequentemente de nos respeitarmos.

Hoje já ofereço oportunidade a quem me ama de demonstrar esse afecto, aceitando o ombro que por vezes tanto preciso e agarrando a mão que me segura quando tudo me diz para largar.

Longo tem sido o caminho. Reconheço de onde vim e sei para onde quero ir. Sei que não foi de Kripton (talvez de um planeta por ali perto..) pelo que não sou, nem quero ser mais uma super-mulher. Nem uma menina bonita...
Quero ser eu. E eu também sou frágil apesar da minha força. Também sofro embora aguente. Também sinto ainda que finja.
Vou voltar a ser pequena, despir-me diante do mundo e, outra vez inocente, olhar para lá das fronteiras que me desenharam.
Querem vir comigo?
IdoMind
About my fellings...

abril 22, 2009

Horizontes





Posso ir para a China se quiser. Posso pôr um par de sandálias nos pés e ir pregar aos peixes de todos os oceanos. Posso casar. Posso só namorar. Um ou muitos. De cada vez ou ao mesmo tempo. Posso dar um abraço à minha mãe e esquecer as diferenças.

Posso ir apanhar túlipas para a Holanda no Inverno e fazer surf na Costa Rica durante o Verão. Posso dançar em qualquer lado a qualquer momento. Posso deitar a língua de fora ao rapaz do supermercado da minha rua. Posso dizer agora aquele adeus difícil.

Posso pintar o cabelo de cor de rosa e dar depois mais um abraço à minha mãe por uma nova diferença. Posso morar no campo ou na praia. Posso ouvir Mozart ou Ratos do Porão. Posso usar amarelo com vermelho. Posso vender tapetes em Marrocos.

Posso ser budista. E ali ao lado, espreitar o hinduísmo. Posso descobrir que acredito apenas em mim. Posso permitir-me o silêncio. Posso esconder-me dos outros. Até decidir convidá-los para a minha toca.. ou não. Posso beijar um sapo.

Posso respirar fundo e trazer do estômago quem eu sou. Posso gostar de mim, perdoar-me por não ser perfeita. Posso aceitar-me. Admitir que há muito lixo para deitar fora e muito alcatrão para pisar. Posso amar mais. Posso amar muito mais. Dar-me. Estar. Inteira e com verdade. Posso não ter tanto medo.
Posso viver. E se não chegar, posso então decidir participar.
Posso sempre vestir um sorriso.
Posso ESCOLHER…

Também posso não fazer nada. Por algum tempo,por muito tempo ou pelo tempo necessário a reunir forças para fazer tudo o que posso ou estar tão cansada que a única alternativa é fazer alguma coisa.
Importante é saber que posso.
E vocês, o que podem?
IdoMind
about being all I could be...and more

abril 16, 2009

Para ti, Jardineira Incansável do Meu Jardim



Era tudo tão diferente.
Nessa altura ainda não te via.
A profundeza dos teus olhos ainda não me prendia,
o fogo que dança em ti ainda não me encantava,
nem a tua inquietude contagiante me alimentava.
Ali estava eu, tão ausente…


Tudo era mesmo diferente.
Também ainda não te conseguia ouvir.
Que linguagem estranha era aquela do sentir?
As mãos pedintes, assim esticadas, procurando-me.
Os gritos sempre incompreendidos, acordando-me.
E ali continuava eu, tão distante.

Hoje sou diferente e tu… singular
Na entrega pura que te fez ficar junto a mim,
nesta estrada que já vai ficando comprida.
Plantamos agora pedaços do céu num jardim,
regamos com magia, partilhamos a vida tão florida
fazendo do grande amor, o nosso ar.

Amo-te.
Finalmente.
PARABÉNS!

abril 11, 2009

Ovos da Páscoa

O Jardim está a preparar-se para receber amanhã, Domingo de Páscoa, os seus ovos.

Reza a lenda que na quinta-feira santa os sinos saem das igrejas de todo o mundo e voam até Roma, onde fazem uma fila e esperam pelas bênçãos do Papa. Na viagem de regresso vão deixando cair ovos nos Jardins de todo o Mundo, que as crianças e adultos, no Domingo de manhã, procuram para receberem as bênçãos também.

Os sinos das Igrejas estão em silêncio desde essa quinta-feira e só no dia de Páscoa rejubilam e nos envolvem com os seus sons, por isso, no Domingo quando ouvirem os sinos, lembrem-se de olhar à vossa volta e procurar os ovos de ouro que este período tão bem plantou dentro de nós!

Oiçam os sons que vão ecoar no Vosso Jardim e aceitem-nos como indicações de onde devem plantar, semear, nutrir, cuidar, as vossas sementes.

Que assim seja sempre!

abril 03, 2009

HOJE VI DEUS


Num acto de bravura sem igual na vida desta tímida jardineira, lanço aqui uma semente até à data escondida nas profundezas do meu mundo privado.
Tenho por hábito, no final de cada dia, escolher um momento que por algum motivo me tenha dito algo de especial e a que chamei “Hoje vi Deus”. Fica registado no diário que mantenho dos meus devaneios, como este, entre outros igualmente permeados de sonho e fantasia.

Para mim é importante “ver Deus” todos os dias, por forma a não esquecer que no meio da loucura que confundimos por sanidade, das nossas pressas para ir a lado nenhum, do cinzentismo social que elegemos a cor da moda, a Verdade e a Beleza rompem por entre as mais espessas muralhas que erguemos, mostrando-nos a grandeza desta experiência e a expondo a nu a Grande Ilusão.

Ninguém fica indiferente ao toque do sagrado. Independentemente das nossas crenças religiosas, ou da ausência destas, todos, a determinada altura, sentimos a mão de algo que nos transcende. Este momento é único porque não o conseguimos ignorar e porque, mesmo que não nos apercebamos de imediato, muda-nos.
Ateístas, gnósticos, simplesmente distraídos e até alguns inflexiveis, todos uma altura ou outra já foram parados para sentir que há mais entre o céu e a terra do que pode imaginar a nossa vã filosofia.
Eu acredito que há. É essa minha percepção das coisas misteriosas, para mim maravilhosas, que guardo sob a forma de palavras no registo da passagem por esta minha vida tão cheia de riqueza. E cada vez vejo mais tesouros.
Hoje, sexta-feira, dia de Vénus, decidi partilhar os meus tesouros. Bem sei que parece ridículo, mas tenho constatado que as coisas verdadeiras na vida são ridículas...Então aí vai, because:



A semana passada fui testemunha de uma descida do céu à terra e é por esse momento que vou começar esta partilha “ Hoje vi Deus” porque me emocionou de modo particular.


O instrumento para esta manifestação divina foi um homem cuja constituição física robusta só é comparável à imensa doçura do seu olhar. Grande, forte, sólido, nada faria esperar que ensinasse a dançar...E foi uma das suas aulas que fui experimentar. Com muita, muita relutância. Como referi, sou tímida e estar numa sala repleta de mulheres semi-despidas a bambalearem-se, acho que pode considerar-se um grande passo no sentido de vencer os meus traumas… A chamada terapia de choque. Freud ficaria orgulhoso de mim.
Estava um pouco constrangida e percebi na pele o significado da expressão “peixe fora de água”. Deslocada do meu habit natural, tentava seguir os passos que ele ia ensinando. Valeu-me a companhia de um Amigo, que não me deixou enfrentar sozinha aquela selva de braços, pernas e seios a saltar por todo o lado.

Foquei o meu olhar no professor na tentativa de me abstrair e executar a missão a que me propus: sobreviver àquela aula.

Nesse momento, ele fechou os olhos e enquanto movia o corpo, balançando-se, dizia “sintam a música”, “sintam a música”. Disse esta frase três vezes, elevando gradualmente o tom de voz até que à terceira vez, sempre de olhos cerrados, disse “sintam a música - AQUI!” e bateu com a mão no peito, no sítio do coração. Foi um grito vindo da alma aquele “AQUI”.
Vi-o então brilhar uma luz mais forte, porque percebi que o Amor habitava naquele homem quando dançava.
Tive vontade de sentar-me na sala e ficar ali, apenas a vê-lo dançar. Agradeci profundamente a benção daquele momento mágico de puro SER.
Depois disso, esqueci todas as pessoas que ali estavam.Esqueci que era envergonhada e esqueci também os meus bloqueios. Dancei, pulei, mexi-me. O melhor que consegui. Tudo o que queria era misturar-me naquela energia linda que irradiava dele.

Lembro-me que no caminho para casa ainda ia meio atordoada a reviver o instante. Lamentei não ter fechado os olhos e ter-me rendido à vontade genuína de lhe dar um grande abraço no final e agradecer-lhe por me ter mostrado Deus.

E está feito.
As pequenas felicidades, as grandes alegrias e o amor constante, estão por todo o lado, mas entram apenas onde os deixam entrar. Hoje abri aqui uma janela e gostava muito que cada um procurasse abrir também algumas e o partilhasse, se assim pedir o vosso coração.
Quem sabe se os vossos tesouros não são também as riquezas de outros…
Fica o convite.
IdoMind
...about living brighter, better and dancing
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