novembro 24, 2009

Com os teus sapatos


Andei a calçar sapatos. Estava exausta dos que trago. Descalcei-me por um bocado e quase ouvi os meus pés a respirar. E a agradecer. Eu também respirei. E agradeci com um suspiro, pela força que me fez dar tantos passos até ali. Reconheci que não tem mal sentarmo-nos por um instante. Ou por muitos. Por todos os que forem precisos para calar tudo o que grita há tanto tempo. De cansaço. De desalento. Por todos os que forem precisos para reinventar uma vida. Pelo instante necessário para esperar pela fé que ficou um pouco lá atrás.

Sentada na minha berma vi os outros pés a passar. Todos calçados.Imaginei-me a andar neles e veio uma dor ao peito que só o perdão amainou. E a promessa de calçar muitos sapatos. Todos os que puder para que entenda que são de gigante alguns passos pequenos. Que é difícil arrastarmos nos pés o que não nos serve.
Os sapatos grandes, maiores que nós, que nos vão aspirando até sermos só lembrança da pessoa que nunca conseguiu dizer não. Daquele que tudo podia. Do incansável que não demarcou as suas fronteiras. O sem limites que se diluiu nos sonhos alheios. À noite, enquanto arruma os seus enormes sapatos, vai-se adormecendo ao sabor de uma qualquer redenção, oca e cara.

Também ainda não tinha parado para ver como andam apertados alguns pés. Conformados a um molde que não é o seu. Pés bonitos que por quererem caber em espaços menores, se vão deformando. Lenta e dolorosamente. São pés tímidos que o medo da rejeição mantêm atados.
E aqueles saltos altos… lindos, elegantes. Hinos a um equilibrismo conquistado. O retrato composto em exibição pública. A imagem impecável que não combina com choro. Com dias maus. Com luas fortes.Os sapatos de saltos altos que te fazem sentir mais bonita. Mais alguém. Sem eles é como se andasses nua e entendendo-te porque também tenho os meus apoios.

Hoje, até calcei uns ténis.Percebi melhor que não é fácil ser genuíno num mundo que nos quer previsíveis. Responsáveis. Amarráveis…Capazes de abdicar do conforto de sermos nós, a viver a nossa vida, para sermos os outros a viver a vida que querem para nós. Gostei de sentir esta audácia. De dizer com os teus ténis que não sou igual. Assumindo as consequências da diferença.

Se pudéssemos sempre calçar os sapatos uns dos outros. Apenas para sentir um coração que não o nosso. Para perceber que também acelera. Que arrefece. Que pulsa ao ritmo do que dá e do que recebe.
Se pudéssemos todos fazer uma paragem e trocar de calçado. Usar sapatos mágicos que nos conduzissem pela vida a dançar. Que dessem para voar. Sapatinhos de cristal a condizer com nossa alma transparente.

Se pudéssemos andar descalços sem magoar os pés…
IdoMind
about what you wear

17 comentários:

adriana disse...

Pés...
Símbolos tão fortes...
Apêndices da alma?

E onde escolhemos ficar...
Em um ou noutra?
Em ambos?
Será esta mágica possível?
beijo, Querida

Viajante disse...

Olá IdoMinde

Onde poderemos chegar com as metáforas? Neste texto quase ortopédico puseste a nu alguns dos problemas que nos afectam enquanto humanidade.
Eu acho que o melhor é não usarmos sapatos mesmo que o caminho possa magoar um pouco os pés

Saudações

O Viajante

Fada Moranga disse...

Querida Jardineira, que texto bonito! Quando escreves ficas menos rabina... ;-)

Toma lá um sapatinho amigável:
http://www.flickr.com/photos/moranga/102253880/in/set-72057594064494138/

Bem hajas, oh alminha doce!
Beijos***deFada

IdoMind disse...

Adriana

Tantas saudades...Para quando outras Dimensões? Internas, externas ou ambas...sinto a tua falta.

Acho que caminhar é esse Diálogo entre um e outra.Sim, essa mágica é possível. Dificil, mas possivel.

Mil beijos e um abraço forte

IdoMind disse...

Meu querido Amigo

Texto ortopédico! lol Estou bem precisada de uns endireitanços...

Todos temos as nossas batalhas e os dias em que usamos a botas mais duras e noutros os chinelos mais despretenciosos. O facto é que não podemos parar.

Sem sapatos? Ainda não sei como responder.Acho que se calhar temos de os escolher melhor. À nossa medida, bem confortáveis, para chegarmos ao fim sem feridas...

beijos terráqueo lindo

IdoMind disse...

Fada,

Tão linda!!!!! Bem a combinar com o Jardim. E com a Jardineira!
Adorei.

Beijos

Unknown disse...

Pois é, IdoMind, por essas e por outras é que este ano tenho andado com sandálias cómodas e agora calço uma meias. Pareço um holandês. Sei que é a antítese da elegância, mas os meus pés agradecem muito. E a alma não sofre tanto. Beijokas.

Marisa Borges disse...

IdoCoração (ficava giro com o símbolo)

para quê negares, todo este texto prova as palavras que escrevi sobre ti, é só amor a exalar de cada palavra!!! IdoHeart tb pode ser

O que um sonho provocou?!? Tamém eu tenh ode aceitar que às vezes precisamos de parar no caminho, é natural, como um bebé que adormece na viagem. A aceitação de como somos parte muito por aí.

Obrigada por calçares os meus sapatos de vez em quando! Beijocas minha doce coraçãozinho

IdoMind disse...

Querido António (ou Tibério? Até na identidade és versátil...)

Mais nada! Usar o que nos faz andar melhor.
Com a tua sabedoria não me espanta a escolha.

Mil beijos

IdoMind disse...

Shin

Estás a dar-me cabo da reputação!
Idoheart? Achas?Eu sou toda Mind...
tenho de pensar sobre isso lol

Pois é. Dei por mim a julgar alguém sem lhe ter olhado para os pés. Fiquei tão triste comigo que escrevi isto.

Do lado de lá, há sempre outro ser humano como nós, a fazer o que pode. O que sabe. É preciso ter isto presente.

Os teus sapatos são fáceis de calçar. São dos tais que dão para voar....

Amo-te TAAAAAAnto

adriana disse...

Estou rindo aqui.
Passei para "ouvir" a resposta e vejo Shinita dizendo algo que sempre estive para dizer:
-IdoHeart
Sem dúvida!
No que me cabe, já estás "rebatizada"... rs.
Adoro sincronicidades.
Elas nos indicam o Caminho.
beijos a todos!

Marisa Borges disse...

IdoHeart ;) para te ires habituando à ideia!!!

não diria que o texto era fruto de um julgamento, agora que sei isso só posso dizer que a lição fio aprendida, pois escreveste com tanta humildade e amor que nos inspiras!

Também te amo muito e cada vez mais grata pelo nosso reencontro na mesma família!

;***

Adriana:

boa, boa!!Adorei!!!

IdoMind disse...

Adriana e Shin,

Bonito, agora juntaram-se para me converter!

IdoMind about the heart. Pode ser?

Adoro-vos. Às duas

Um abraço apertado

FadaMoranga disse...

Bem, eu estava aqui ssugadita a ver a conversa e confesso que IdoHeart não soa bem... E que tal IdoLove?

Pronto, já desabafei.
Bem hajam e beijos***deFada

Marisa Borges disse...

Ahahahah
Fada FAda

linda como sempre.

Olha a ideia é a seguinte Ido♥ assim não se diz o heart que pode parecer/soar hurt!!!

Mas ó pa mim aqui a decidir as coisas da sis LOL

Desculpa IdoMind!!! ;****

IdoMind disse...

Fada, Fada

IdoLove é muito bom mas não pode ser, mentir é feio ;)

Mas afinal qual é o problema de IdoMind??

ssugadita...como se conseguisses!

beijos fada linda

IdoMind disse...

Mana,

IDOMIND - é assim que vai ficar.

Agradeço as sugestões, muito criativas, mas ainda não estou pronta para outro baptismo.

E agradeço-te por nunc ateres desistido deste heart tão escondidinho pela Mind...

beijos sacerdotisa

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