Estou aqui há um bom bocado. Já escrevi cinco ou seis linhas por cinco ou seis vezes. Apaguei tudo. As palavras não chegam. Já senti isto antes. Querer dizer o que descobri não ter linguagem. É uma coisa qualquer que se passa dentro de nós sem que a consigamos explicar. Sentimos só. Está lá, a trabalhar no silêncio. A roer as estruturas da pessoa que fomos aprendendo a chamar eu.
Vem devagar, disfarçada de insatisfação. Rouba-nos aos poucos todos os esconderijos onde, refugiados da Voz que chama por nós, vamos fingindo uma paz que há muito nos declarou guerra. Vamos-nos convencendo que é por bondade, piedade e até amor que nos aprisionamos a decisões sem sentido. Sem sabor. Desprovidas de outro sentimento senão mágoa pelo sacrifico que ninguém parece reconhecer e rasgos de raiva nos dias em que o peso nas asas dói mais um bocadinho.
E sabemos que aquele não é já o nosso lugar. Todos sabemos quando os lugares deixam de ser nossos. Ou para nós. Basta perceber que estamos piores… em tantas coisas. A impaciência pronta a disparar a mais uma pergunta estúpida. Quando estamos piores todas as perguntas nos parecem estúpidas. O cansaço sufoca a tolerância. Também ficamos mais cansados mais depressa. De tudo. O querer desligar o telefone que nem sequer tínhamos vontade de atender. Responder à pressa e por favor porque na verdade não há nada a dizer e muito pouco que se queira ouvir. Estamos piores quando sabemos de olhos fechados as respostas que devem ser dadas. E o diálogo se converte na soma pobre de dois monólogos.
Nos lugares a que já não pertencemos passamos a agir como visitas. Estamos ali mas pertencemos lá.
Somos pássaros, a ver da gaiola, o sol a por-se mais uma vez. A noite vem e as grades apertam. Resta-nos imaginar… Que voamos. Que provamos. Que cantamos. Que vamos. Não importa onde. O destino é um detalhe. O que conta é cruzar os céus e descobrir uma migalha escondida em cada nuvem. E imaginamo-nos a planar no imenso azul, perdidos num tempo e num espaço da outra vida que não vivemos. Estamos piores quando imaginamos muito e voamos pouco.
Quando a nossa liberdade é hipotecada pela segurança de ser igual a todos os outros.
E o medo de abrir a porta e partir é baptizado de responsabilidade. Afinal construíram-se coisas, criaram-se laços, assumiram-se compromissos. Dependências.
Que seria do mundo se quebrássemos os laços sempre que estes se tornam nós? Apertados e complexos. Que nos magoam os pulsos e estrangulam o coração. Pode ser que volte a ser como antes…Que as fendas que estalaram sejam reparáveis. Esqueciveis. Pode ser que volte a ser bonito. Inocente. Verdadeiro.
O dia passa e o sol, de novo, se põe. Pode ser que amanhã seja diferente.
IdoMind
about getting myself together real soon
4 comentários:
Linda partilha que fizeste com este texto. Agradeço.
E como te entendo:)
Abraço and hope that you get yourself together real soon.
Está simplesmente fantástico. Esse talento...É dificil não reconhecer.
Beijinhos
Olá Clara
eu é que agradeço teres vindo até aqui deixar a tua preciosa gota.
Já não me aguento mais tão deprimida!lol
Espero mesmo que passe rápido.
beijinhos e volta
Luís
Gosto tanto que venha aqui jardinar :)
Obrigado. Sabes aquele mito que há em relação aos artistas serem todos uns perturbados e mergulhados em estado de profunda infelicidade? Acho que é verdade lol lol Quando estou triste a escrita flui melhor...Oh que tristeza!
beijinhos e até logo?
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