fevereiro 29, 2012

Exigências das Existências

- Mas está no contrato. Ela leu e assinou. Paciência. Não vou prescindir do meu direito. Tenho pena mas é a vida. Todos temos problemas – dizia, desfiando o terço de frases telegráficas que se entoam para calar com a mente o que a alma não aceita.
Continuou a rezar.
- Já viu o que seria se fossemos todos esquecer aquilo a que as pessoas se comprometeram? Como se não tivessem o dever de cumprir o que disseram ou assinaram? Era o caos.
- Pois, eu dava-lhe um nome diferente.
- Qual?
- Um excelente recomeço…

Ficou em silêncio à espera que eu desenvolvesse. Eu desenvolvi.
-  Diga-me,  quantas vezes, enquanto conduzia, jantava ou fingia que via televisão, não estava a desejar,  interiormente e angustiado, que alguém lhe desse a oportunidade de voltar atrás e o libertasse de uma obrigação. Quantas vezes não pediu por um milagre e ser perdoado de uma dívida, de um erro, de uma escolha feita às pressas e de costas contra uma parede? Encurralado pela falta de alternativas. Quantas vezes ficou sem dormir, doente, quase agoniado de tanto medo por um prazo que viu a aproximar-se depressa demais para ser parado a tempo. Sinceramente, quantas vezes não se arrependeu de ter dado a sua palavra e dar depois tudo para o não ter feito?

Os olhos cresceram-lhe. Fiquei com a impressão de ter acordado memórias das etapas feitas com cordas à voltas das mãos. Enroladas no pescoço. Talvez por isso tenha engolido em seco...
- O que faço? – perguntou-me já sem terço nos lábios.
- Não sei. Eu acredito que nenhum bem perdura se assente no mal de outro. O meu bem é altamente contagioso. Daqueles que se pega ao meu próximo e ficamos todos melhor. Mas isto sou eu. O senhor saberá que bem é o seu. Ou qual quer que seja.

Foi embora e, não percebi, se aborrecido comigo ou triste com ele. Suponho que saberei para a semana, na próxima reunião que me pediu para agendar.
Eu fiquei. Parei e fui beber café frente ao meu mar que tem sempre alguma coisa para me dizer. Talvez tenha pisado outro limite. Tenho cada vez menos. Ou não os vejo. Mas a verdade é que só testemunhei a minha verdade. E aquela pessoa não procurou outra pessoa. Procurou-me a mim para o ajudar a resolver aquele problema. A minha verdade é essa, o bem não causa mal. O bem não oprime, liberta. Não carrega, alivia. Não obriga, pergunta “ ainda é o que queres”?


Sei que podemos, mas ainda não sabemos como, criar o nosso amanhã. As promessas só podem ser cumpridas por quem já fez o futuro hoje. São poucos. E esses não precisam de prometer porque é no compromisso consigo que se fazem livres.

Se alguém não cumpre o que diz é porque não quer ou não pode. Em qualquer uma das hipóteses, porquê obrigá-la? Porquê forçar outro ser humano a fazer o que não quer ou não pode? Está a escolher o seu caminho e num destes quilómetros vai parar para colher. Connosco fica a decisão de seguirmos o nosso próprio ou de abrir trincheiras e ficar a disparar razões. Direitos. Vidas que nem sempre correm como se esperava… Queixamos-nos do que nos cobram sem porém abdicarmos de um cêntimo, de uma vírgula, de uma hora ou dia a mais do que nos prometeram.

Parece subversão. Mas não é. Tão pouco tolerância idiota. Sou compreensiva, não estou morta. Bato o pé, dou aquele murro na mesa ou um belo grito para defender quem sou. Sem qualquer problema ou mossa na auréola. Mudo. Peço desculpa. Algumas vezes. Outras não. Dou mais murros e mais gritos pelo direito à mudança. Que tanto preciso. Vou fazendo o que posso, como sei. Não é assim que fazemos todos? Mas tenho esta mania de me andar sempre a remodelar. Gostava de fazer Bem. Mesmo bem.
Este homem veio dar-me uma sugestão: rever as promessas que me fizeram e perguntar “ ainda é o que queres?”
Idomind
about losing my job for a better world

p.s. não mudei a música porque continua a ser adequada

2 comentários:

Marcia Toito disse...

Você sempre me encanta com seu pensar, queria escrever assim, sentir assim...

IdoMind disse...

Márcia...minha pasteleira maravilhosa


A sua maneira de sentir está perfeita como está.
A de escrever também. É só escrever, né!!!

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